ADVENTO: TEMPO DE ALEGRE ESPERANÇA

01/12/2020

Na Igreja Católica Romana, nomeamos Advento ao tempo de preparação para a celebração da Solenidade do Natal do Senhor, isto é, a memória de seu nascimento em Belém. Desde há muitos séculos, os cristãos vivenciamos este tempo especial reservado à meditação, à reflexão, à piedade, numa perspectiva de espera. Não seria de se espantar que a recordação da grandiosidade da Encarnação de Jesus Cristo merecesse um tempo prévio que caracterizasse a manifestação da fé do povo de Deus. 

Não existe consenso sobre data precisa de início das práticas de piedade especificamente destinadas aos dias ou semanas que antecediam a celebração do Natal. E é evidente que, mesmo que Roma o tenha celebrado nesse dia bem antes de a data do Natal ser definitivamente fixada no Ocidente aos 25 de dezembro, não se poderia falar em "Advento" inclusive no Oriente - que só passou a celebrar o Natal na referida data a partir de fins do IV século - nome que foi atribuído bastante tempo depois.

Registram-se já no V século da era cristã a motivação de pregadores aos fiéis com o intuito de os preparar à celebração do Natal. Dois sermões de São Máximo de Turim e alguns outros que, apesar de atribuídos outrora a Santo Ambrósio e Santo Agostinho, despertam em estudiosos da atualidade a tendência a considerá-los como de autoria de São Cesário de Arles. E, mesmo que não se estabelecesse uma duração específica ao sobredito tempo, os sermões mais antigos sugerem a apropriação pelo povo, bem como os textos mais medievais de São Ivo de Chartres e São Bernardo de Claraval, que diferem daquelas homilias estritamente associadas à celebração litúrgica do domingo, escritos especiais ditos do "Adventu Domini". 

O registro mais antigo de que se tem notícia a respeito de uma prática desse "advento" encontra-se em certa passagem da História dos Francos, de São Gregório de Tours, segunda metade do VI século, na qual descreve jejum determinado por São Perpétuo - um de seus antecessores no episcopado - para que a comunidade de fiéis realizassem três jejuns semanais, desde a festa de São Martinho até o Natal.

Em 567, o II Concílio de Tours determinou aos monges um jejum que durasse do início de dezembro até o Natal. A determinação foi retomada pelo Concílio de Mâcon, em 582, e previa o jejum às segundas, quartas e sextas-feiras, do dia de São Martinho ao Natal. A "quaresma de São Martinho" fora, então difundida entre os fiéis e passou a ser vista como obra de profunda sacralidade. Com o tempo a prática foi se relaxando e os 43 dias reduziram-se a quatro semanas. Incialmente difundido na Gália, o exercício de piedade alcançou, depois, a Inglaterra, a Itália, a Alemanha, a Espanha...

Mesmo que São Pedro Damião, no XI século, e São Luís, no XIII, recomendassem a observância do jejum por quarenta dias, há indícios de que a redução de tal prática a quatro semanas venha desde o século IX - como indicam não somente uma carta do Papa São Nicolau, mas também escritos do bispo Ratério de Verona e de Abão, santo monge de Fleury - e que tenha sido assimilada pela liturgia até os nossos dias, ainda que não houvesse uma unidade na prescrição de missas e ofícios em breviários e sacramentários e que algumas igrejas particulares da França conservassem a extensão de cinco domingos na primeira metade do segundo milênio.

Com o tempo o jejum passou a cair cada vez mais em desuso e a ser reduzido a simples abstinência, apesar de posicionamentos bem contrários a isso, como o de Inocêncio III e Urbano V. Bento XIV, quando ainda arcebispo de Bolonha, incentivava fervorosamente seus clérigos a exortarem os fiéis às práticas do Advento, explicando-lhes que não era exclusividade dos religiosos uma preparação para ainda melhor celebrarem a Festa do Nascimento do Senhor. 

Se, daquela época até os dias atuais, as recomendações e vivências externas assumiram características de cada região, cultura e mesmo as celebrações litúrgicas tenham se adaptado a variações de um mesmo rito ou de ritos distintos, como, por exemplo, a proposição de São Gregório, que, segundo alguns autores, pode ter sido o autor do preceito eclesiástico do Advento para as igrejas de rito romano, a dimensão da espera não mudou. Advento é tempo de espera, de atenção, vigilância, de zelo, de cuidado, de solicitude. Advento é tempo de entrever e mergulhar na dimensão tripla da vinda de Cristo: nascimento, ressurreição e a vinda triunfante para o julgamento. 

Propõe-se enxergar o Advento sob dois prismas: seja um tempo particular de vivência em preparo à festa do Natal do Senhor, com adoção de práticas de penitência e piedade popular; seja uma liturgia, com ofícios eclesiásticos organizados com a mesma fidelidade, refletindo a manifestação de espera da Igreja como depositária da fé e tradição e grande anunciadora do mistério do Verbo encarnado.

Nesse sentido, erguem-se alguns questionamentos diante do vocábulo "espera"... Espera de quem? De quê? Espera de quanto tempo? Que nós esperamos? Que se espera de nós ou quem espera algo de nós? Sob iluminação peculiar neste tempo de graça que é o Advento, a tentativa de resposta pode surgir da reflexão de um teólogo europeu que afirma "ser a espera a função por excelência do cristão e o traço mais distintivo de nossa religião".

Esperamos desde a criação do mundo, esperamos com os patriarcas e profetas, com o povo exilado e escravizado noutras terras, esperamos com os sábios do Oriente, esperamos com os pastores, com os enfermos que foram curados, com a família de Betânia, esperamos com a tristeza dos apóstolos depois de tudo o que aconteceu em Jerusalém naquele dia e sobre o que se comentava no trajeto de Emaús... Esperamos com os mártires dos primeiros séculos e os de hoje, com os doutores e as virgens, com a Igreja padecente, com os louvores dos claustros, esperamos com a juventude que exalta o Senhor nos seus cantos e danças, esperamos com doentes nos hospitais, esperamos com encarcerados e refugiados, com os pobres e marginalizados, com os imigrantes e os excluídos... Esperamos a paz no mundo e o dia em que a glória do Senhor virá transformar o universo. 

Esperar, portanto, não se define como atitude passiva diante de uma abstração, de algo inacessível. Nós somos cristãos e esperamos o Senhor de nossas vidas. Esperamos, ao longo do Advento especialmente, poder celebrar a Encarnação do Verbo de Deus, sua vinda à nossa condição humana, sua apropriação da natureza do homem em todas as suas realidades, com exceção do pecado. E, se hoje não se exigem vivências de jejuns e abstinência, recitação de fórmulas, ou as condições sociais e prescrições sanitárias não favoreçam grandes manifestações coletivas, comunitárias, procuremos associar em nossa espera, a fé e as obras. Ora, e como fazer...? 

Contribuamos com o Senhor na transformação do mundo. Permitamos que Ele faça de nós instrumentos para que sua misericórdia seja vista e propagada. Vivamos esse tempo do Advento na certeza de que o Senhor Jesus, nos inspira e fortalece a busca da vivência de seu exemplo, da humildade, da obediência, da partilha, do acolhimento e do respeito ao outro, na abertura do coração, na beleza da contemplação desse mistério que nos revela, com delicadeza e simplicidade, sermos todos irmãos.   

Danilo Augusto C. Nogueira

Integrante da Pastoral da Comunicação 

Pastoral da Comunicação - Nossa Senhora da Saúde 
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